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O time versátil

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Na última segunda-feira o Miami Heat bateu o Boston Celtics por 105 a 103 e assim se tornou apenas o segundo time na história da NBA a conseguir 23 vitórias seguidas em uma temporada. O recorde ainda é do Los Angeles Lakers que venceu 33 jogos em sequência entre Novembro de 1971 e Janeiro de 1972.  Após o jogo LeBron James foi educado e disse que conhece muito da história da NBA e ver seu time em segundo nessa lista é uma honra, já Dwyane Wade foi mais direto: “Segundo lugar é o mesmo que estar em último”.

Os dois estão certos, mas a abordagem de Wade parece mais útil para seu time. Pensem bem, o Heat tem 11 vitórias de vantagem sobre o Indiana Pacers, segundo colocado do Leste, e poderia muito bem acabar se acomodando perigosamente na liderança. Ainda é muito cedo para poupar jogadores para os Playoffs e eles não podem esquecer que também brigam contra San Antonio Spurs e Oklahoma City Thunder pela melhor campanha geral da liga, que pode acabar definindo quem tem mando de quadra nas finais da NBA. Se motivar para quebrar o recorde não é só fazer história, mas fazer a equipe continuar competitiva num momento onde eles poderiam facilmente perder o foco.

Mas outra questão sobre esta incrível sequência parece mais importante: como eles conseguiram isso? E, mais importante, podem manter durante o alto nível dos Playoffs?

Entre os muitos motivos que levaram o Heat a estas 23 vitórias seguidas, o que mais me chama a atenção é a regularidade. Calma, não me chamem de burro! Eu sei que vencer 23 jogos seguidos é obviamente um sinal de regularidade, mas me chama a atenção como faltam altos e baixos dentro das próprias partidas, não entre um jogo e outro. De todos estes jogos, em apenas 4 (Hawks, Blazers, Knicks e Celtics) o Heat chegou a perder por 11 pontos ou mais durante o jogo. Contra Knicks e neste último contra o Celtics, as desvantagens aconteceram logo no começo do jogo e não duraram muito.

Não consigo explicar o quanto é absurdo um time passar tanto tempo sem lidar com grandes desvantagens. E uma das razões para o sucesso do Heat é que agora eles sabem como trocar os jogadores durante o jogo sem precisar mudar o estilo de jogo, intensidade e sempre com pelo menos uma grande estrela em quadra.

Dos 20 quintetos mais usados pelo Miami Heat na temporada, apenas dois não tem Wade ou James. É o grupo Cole-Allen-Miller-Battier-Bosh (7º quinteto mais usado) e Cole-Allen-Miller-Haslem-Bosh (13º). Todos os outros tem um dos dois e 10 deles tem os dois atuando um ao lado do outro. Se há dois anos Wade e James pareciam perdidos ao jogar um ao lado do outro, hoje se entrosam muito bem e a combinação vai além das pontes-aéreas nos contra-ataques. Destaque especial para Wade, que reinventou seu jogo para aprender a ser cada vez mais efetivo mesmo sem ter a bola na sua mão o tempo todo.

A grande sacada de Erik Spoelstra para encaixar todo o elenco, e em especial a dupla de estrelas, foi criar papeis no time, não posições. Lembram que no começo do ano o treinador disse que queria um time livre, sem posições? Ele meio que conseguiu isso, dependendo do que você chama de posição. Se achar que deve ser algo como os velhos armadores, alas e pivôs, realmente o time é livre, mas se você encarar de uma maneira nova, talvez como aquele estudo de 13 posições do basquete que divulgamos ano passado, verá que o Heat tem posições, elas apenas não são convencionais e mudam de jogada a jogada.

Por exemplo, ao invés de ter um pivô, o Miami Heat tem jogadas de garrafão. São jogadores que recebem a bola de costas para a cesta, perto ou dentro do garrafão e tem espaço para trabalhar uma jogada lá. Nos últimos jogos pude observar LeBron James, Dwyane Wade, Chris Bosh e até Ray Allen recebendo a bola nessa posição. Em geral a decisão parte da leitura da marcação adversária. No jogo contra o Celtics, por exemplo, Wade não conseguia passar de Avery Bradley durante o primeiro tempo do jogo. Então eles partiram para jogadas onde Wade recebia a bola do lado esquerdo do garrafão, de costas para a cesta. Assim ele conseguiu algumas jogadas, faltas e o Heat voltou para o jogo.

A solução também serve para Ray Allen. Quando o time adversário coloca um armador mais baixo para marcar Allen, encarando ele só como arremessador, ele parte para o garrafão e lá consegue um daqueles giros próximos à cesta. A mesma coisa vale para LeBron James, quando ele vê que está sendo defendido por alguém menor ou mais fraco, ataca no garrafão, deixando a armação de jogada para Wade ou Chalmers.

E este exemplo serve para várias outras funções. Levar a bola da defesa para o ataque tem sido trabalho de LeBron James, até para que ele comece a jogada já atacando e lendo a defesa, mas também é função exercida por Dwyane Wade, Norris Cole ou Mario Chalmers. A função de se posicionar na zona morta para receber passes em infiltrações pode ser feita por Shane Battier, Udonis Haslem o Chris Bosh, cada um mais perto ou longe da cesta de acordo com seu melhor aproveitamento em arremessos. Nas diagonais, em jogadas parecidas, Ray Allen e Mario Chalmers. A variação também acontece na defesa, onde qualquer grupo pode jogar junto de acordo com o que o adversário manda. Contra o Celtics, por exemplo, que estava sem Kevin Garnett, eles usaram um time baixo. Com Shane Battier marcando Jeff Green, LeBron em Paul Pierce, Wade e Chalmers revezando em Bradley e Lee. Times mais altos podem pedir Haslem no grupo ou talvez LeBron defendendo algum ala de força.

Quando tudo funciona, parece algo que todo time deveria fazer. Contratar jogadores versáteis, distribuir funções entre eles e assim ter um time mais solto e imprevisível. Mas não é tão fácil assim. O entrosamento para chegar nisso é doloroso e alvo fácil de criticas, não podemos esquecer os últimos dois anos de críticas sem fim pedindo “um armador de verdade” e um “pivô de verdade” no Miami Heat. Erik Spoelstra precisou de paciência e apoio incondicional de Pat Riley, presidente do Heat, e dos jogadores para fazer seus sistema dar certo. Outro ponto chave para o time funcionar? Ter uma aberração da natureza no elenco.

Seria muito legal Kevin Durant, Tony Parker, Chris Paul ou outro jogador ganhar um prêmio de MVP pela primeira vez em suas carreiras, mas como tirar o prêmio de LeBron James? Ele continua espetacular como sempre, seu time é o de melhor campanha na NBA e os números só argumentam a seu favor. E além disso tudo, ele é o elo que liga todas as formações que o Miami Heat tenta montar. Além de executar qualquer função ofensiva, desde pedir jogadas e distribuir passes até jogar no garrafão, ele marca qualquer jogador na defesa. Qualquer jogador. Sem exceção. Em geral ele marca desde armadores até alas de força, mas duvido que não consiga marcar os pivôs da NBA de hoje em dia, ainda mais estes que gostam tanto de sair do garrafão. Da próxima vez que forem assistir o Miami Heat jogar, se foquem só em LeBron durante algumas jogadas. Veja como ele faz de tudo e parece ter funções completamente diferentes de um lance para outro.

Mas o que eu gostei de ver em LeBron James foi sua atuação no final da partida contra o Boston Celtics. E não porque ele evoluiu ou mudou, mas porque foi exatamente como sempre foi ao longo da carreira. Ele não mudou seu estilo só porque ouviu mil críticas de pessoas desesperadas em condená-lo até vê-lo campeão. Primeiro LeBron procurou Dwyane Wade para um arremesso (que não deu certo), depois achou Wade de novo para uma enterrada (caixa!) e depois não hesitou em mandar a bola da virada para Mario Chalmers, que acertou uma bola decisiva de 3 pontos. Só na jogada final que ele nem pensou em tocar a bola de lado e garantiu a vitória com um jumper de meia distância. Se não tivesse entrado teriam condenado ele como sempre condenaram: por que não bateu pra dentro? Por que não cavou a falta?

Acontece que LeBron James é assim, sempre fez isso. Pouco tempo antes ele tinha infiltrado e sido bloqueado por Jeff Green. O time ficou parado e não deu opção de jogada, era ele no mano a mano, então ele decidiu o arremesso. A jogada não era a de melhor aproveitamento, mas é a jogada que LeBron James sempre preferiu, especialmente quando enfrenta um bom defensor. No jogo contra o Orlando Magic, quando ele também venceu no final, decidiu bater para dentro apenas quando Arron Afflalo ficou preso em um bloqueio e a marcação sobre ele ficou mais baixa e mais fraca. Ou seja, LeBron James é o mesmo de antes em fins de jogos: passa quando acha que tem que passar, infiltra com segurança (não é como Wade, que infiltra às cegas) e arremessa quando essa é a opção. Não quer ser herói, não foca o jogo só nele e no meio do caminho acerta e erra, como qualquer um.

Clique aqui para assistir o vídeo inserido.

Mas e nos Playoffs, será que essa variação toda vai dar resultado? Afinal é mais fácil surpreender e fazer mudanças quando os adversários mudam, mas é difícil apresentar algo de novo em um Jogo 7 de uma longa série onde todo mundo já está enjoado de jogar um contra o outro. Realmente vai ser mais difícil surpreender por lá, mas talvez eles não precisem disso para vencer.

O principal ponto do Heat não é surpreender, mas se adaptar. Lembra que comentamos no último post que o Denver Nuggets não tem plano B? Eles conseguem vencer os adversários quando conseguem impôr seu ritmo veloz, seus rebotes e ataque à cesta. Tem acontecido com frequência assustadora, mas sem isso eles não tem tanto a oferecer. Já o Miami Heat tem um arsenal de jogadas e estilo de jogo mais amplo, podem se adaptar a quase qualquer adversário e jogar assim. Talvez tenham que jogar 7 jogos do mesmo jeito, mas podem se reinventar na série seguinte.

Os times que mais deram problema para o Heat na temporada foram o Denver Nuggets e o Boston Celtics nos jogos em que conseguiram enfraquecer a defesa de transição do Miami Heat, e depois Memphis Grizzlies e Indiana Pacers quando usaram a altura e força de seus garrafões para abusar do time mais baixo e com poucos reboteiros. Mas o Heat mudou seu estilo de jogo no segundo tempo contra o Celtics, adaptando a volta para a defesa e forçando-os a atacar em meia quadra. No último jogo contra o Pacers,  foram mais ativo em evitar que a bola chegasse no garrafão, especialmente nas mãos de David West. Mesmo que os times saibam o caminho para vencer o Heat, o time de Spoelstra tem elenco e versatilidade para se adaptar e sempre dificultar. Claro que sempre vão ter dificuldades contra o garrafão GG do Grizzlies, mas eles tem as armas para diminuir essa vantagem do adversário.

Podemos considerar o Miami Heat favorito ao título? Respondo dizendo que eles tem um elenco saudável, adaptável para enfrentar qualquer adversário, um técnico criativo que sabe ler os adversários, dois dos melhores jogadores da atualidade, provável mando de quadra até as finais e a confiança natural de um time que venceu o título na temporada passada. Está difícil apostar contra.


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